quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Bilhete desaforado a Papai Noel

                                                                                   
Papai Noel, Escrevo esta carta com esperança de ser lido novamente daqui a alguns anos, pelos meus netos Pedro, Maria Clara, Isabella e João Enrique, os quais chegaram a este Mundo agora muito recentemente; e ainda estão aprendendo as letras.

Todavia, espero que aí por volta de 2030, a geração dos meus netos possa avaliar se, enfim, triunfou a estupidez humana, ou se conseguimos, pelo menos, manter viva a esperança.

Ando angustiado porque tenho um entendimento de que, neste início de Milênio, não estamos atravessando apenas mais um momento de turbulência. Estamos dentro do olho do furacão.

A história contemporânea nos levou ao término da onda industrial, à drástica diminuição do Estado, à universalização da sociedade da informação (dominada pelo grande capital financeiro internacional), ao crescimento extraordinário dos fundos de previdência e aos lucros astronômicos das grandes instituições financeiras, fenômeno que fez explodir o estoque de recursos financeiros disponíveis, dos quais uma boa parte tem se destinado a perigosas especulações de curtíssimo prazo.


E, pior que tudo, o crédito aparentemente fácil resultou no endividamento generalizado das famílias, uma bomba (bolha) de efeito retardado que vai explodir na cara dos mais pobres.
Falo do "capital volátil". Um dinheiro sem pátria, ganancioso, sem coração, que quer ganhar muito e, se possível, muito rapidamente.


Algumas fontes chegam a estimá-lo em mais de 30 trilhões de dólares. Com um poder diabólico.

Nada deste dinheiro é investido para melhorar a qualidade de vida, não há interesse em acabar com a fome, nem preservar o meio ambiente do nosso planeta, nem desenvolver qualquer economia, além de ser incontrolável. É a especulação pura e simples.
Além disso, Papai Noel, é preciso não esquecer a virulência da política externa da (por enquanto) maior potência do planeta, agora estimulada pela "vitória" das forças mais conservadoras no Congresso dos EUA.


Para manter os lucros do complexo industrial-militar, e para conquistar reservas estratégicas; já estão preparando também a invasão de outras nações, quiçá uma guerra entre as duas Coréias.

Relembro: para depor Saddam Hussein, Bush mentiu e sacrificou, além das vidas de milhares de iraquianos (mártires, na visão árabe); desrespeitou a ONU, a OTAN (aliança militar ocidental), a coalizão antiterror; comprometeu a imagem dos EUA diante do mundo; destruiu monumentos e milhares de relíquias do berço da civilização e a própria noção de que a humanidade progride, ou deveria estar evoluindo.

Bush inaugurou a barbárie contemporânea. E o elegante Barack Obama, agora Prêmio Nobel da Paz, "salvou" o sistema financeiro, e vai mantendo o dedo no gatilho.

Aparentemente, o mundo caminha, perigosamente, sob uma estúpida hegemonia, no médio prazo, para a barbárie de alta tecnologia.

Será o início do indesejado triunfo da estupidez humana? Será que a imbecilidade das massas populares (da patuléia) realmente não tem limites?

Desconfio que as conseqüências desta globalização imperialista serão desastrosas, pois o que se vê é a concentração de riquezas, ao lado do crescimento da miséria, da exclusão social, e da violência urbana.

Papai Noel, na estação futuro, Pedro, Maria Clara, Isabella e João Enrique poderão tirar a limpo se valeu a pena este avô haver sonhado com a Estrela da Manhã; ou se a estupidez humana triunfou.

Por favor, não me culpe por não gostar mais da sua imagem de bom velhinho. Saiba o senhor que torço e vibro para que, com os pés bem firmes no chão, toda a geração dos meus netos possa ter os olhos, o coração e a mente nas estrelas. Sou um otimista incurável, apesar de você, sua alienação e seu consumismo.

Ingenuamente, talvez, como queria Agostinho (354 a 430 d.C), eu persisto com a Esperança, ao lado de suas duas filhas lindas: a Indignação e a Coragem de continuar lutando por um mundo melhor.

E que Pedro, Maria Clara, Isabella e João Enrique possam encontrar motivos para continuar gostando de sua pessoa.

Eu, de minha parte, não consigo mais gostar do senhor. Mudei, porque o mundo mudou, e mudou também o Natal. Se quiser ainda me encontrar, procure-me no olhar triste das crianças de rua. 

Rinaldo Barros-professor da UERN

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